sábado, 2 de abril de 2016

A partida



Hoje o dia acordou triste.
E temendo presenciar uma despedida,
o sol fizera-se tímido em surgir:
covardemente absconso
na muralha de nuvens cinzas e hostis.

A cantoria aviária desaffinou vigorosamente.
O barulho do mar insiste em enfadar
ondas esvaem-se em cada rebento
e, na areia, não mais imprimem
suas delicadas assinaturas.

A brisa do mar. Ah, a brisa do mar...
marota, sussurra nos ouvidos
verdades e lembranças malquistas
que quedam-se em abandonar.
Poseidon descansa nas profundezas.

A tempestade é contumaz:
trovões ensurdecem a mente
raios cegam um coração
a chuva encharca as esperanças
diluindo-as na sádica realidade.

Arredores dilacerados
em palavras decrépitas e caducas.
Gentis significados outrora imputados  
doravante suspensos pela emotividade            
reclamam sentido e existência.

Erros do passado – o dito e o não dito.
Conglomerado de dúvidas e inseguranças
mixados num coquetel de provações,
ansiosos por serem degustados
de uma só vez, a um só gole.

Neuralgia do rompimento:
insuportável dor
melancólico crepúsculo.
Desfalecido um sentimento declara:
– Aqui jaz o tempo da poesia!